Ensaio Sobre a Violência – Dois

Bom, antes de voltar ao ritmo habitual do site, talvez seja interessante mencionar algo que há algum tempo tem me incomodado (e mais ainda agora, já que sofri um assalto que me deixou bem assustado com algumas coisas, mas enfim).

A violência encanta. Não adianta tentar dizer o contrário, ela está em novelas, em filmes, em praticamente qualquer obra de ação que olhemos. Ela encanta de tal forma que nos acostumamos com ela, que “é normal” ouvir um tiroteio de vez em quando, que “não sei quem foi assaltado, colocaram uma arma na cabeça dele”, e outras histórias que são ditas e repetidas pelas mais diversas pessoas, e que todos acabam ouvindo eventualmente numa conversa de ônibus, numa pessoa falando muito alto no celular, ou algo semelhante.

Exceto que não deveria ser deste jeito.

Quando as coisas acontecem com você, parece que alguma coisa muda. Olhando bem, você fica imaginando-se, naquela situação, relembrando os atos, sendo deixado sozinho no meio de uma rodovia, sem documento nenhum, sem absolutamente nenhuma forma de comunicação, e fica dependente da bondade de estranhos que também têm medo de serem assaltados e provavelmente não vão confiar em alguém pedindo ajuda à noite numa rodovia, certo? E depois desta tortura, a segunda tortura que é ligar para a polícia, através de um telefone emprestado de alguém, pedindo ajuda e esperar, e esperar, e esperar, até finalmente se tocar que a viatura que eles disseram que iam mandar pra te ajudar não vai chegar. E então você consegue uma carona de uma alma bondosa que não vai aparecer em jornal algum embora merecesse uma grande recompensa, vai até uma delegacia, e lá começa a retratar e reviver o que aconteceu para um escrivão que te olha com cara de “por que você está aqui me fazendo perder meu tempo”, até o momento em que você se sente não a vítima, mas o culpado. E de repente, finalmente um estalo no seu cérebro que lhe diz que não, não vai adiantar nada chamar a polícia e que você só está fazendo boletim de ocorrência por causa do seguro… e você percebe que aqueles que lhe assaltaram vão ficar impunes, e que provavelmente a punição deles virá no dia em que assaltarem a pessoa errada, que provavelmente vai estar armada e vai reagir… mas isso, se acontecer, vai demorar ainda, e enquanto isso você vai voltar pra casa, tirar todos os seus documentos de novo, comprar um novo veículo e sair de casa com medo de ser assaltado de novo…

É… pessoalmente, a violência não tem NADA de encantadora.
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